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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

A PANELA ELÉTRICA DE ARROZ


Em 1988, ganhei uma panela japonesa de fazer arroz. Foi um dos melhores presentes, do tipo prático e solidário, que ganhei na vida. Em uma viagem a Manaus, conheci e ganhei a panela. Cara demais, valeu sua importância em dólares. Foi sugestão e presente do marido. Sempre fui apaixonada por panelas. Aquelas branquinhas, esmaltadas, com desenhos coloridos, quando começaram a aparecer na praça, passaram a ser meu sonho de consumo. Não as comprava, só namorava...

Quando a panela de arroz chegou na minha vida, eu costumava trabalhar dois turnos, envolvida com educação, e o tempo que sobrava eu cuidava de quatro filhos, duas casas, e um marido. Os filhos tinham idades que variavam de sete a dezenove anos (eles têm diferença média de três anos entre um e outro). Uma casa era na chácara, onde ficava o mais velho que só estudava à noite; e a outra era um apartamento em Taguatinga, que nos servia de apoio, pois era ali que almoçávamos. Aí, o marido e eu voltávamos para o trabalho, e cada um dos filhos partia para atividades extras, como educação física, aulas de inglês, de reforço, cinema... Ou esperavam a hora de voltarmos para a casa na chácara. Era no apartamento que a panela ficava. Eu costumava dizer que ficava sem empregada, mas não ficava sem a panela de arroz! E isso de ficar sem ajudante acontecia muitas vezes. De manhã, depois de deixar os três menores na escola, eu passava no apartamento e deixava o almoço encaminhado. O arroz era colocado na panela, com tempero, óleo e água e pronto! era só ligar na tomada. Na hora do almoço, o arroz estava com-jeito-de-arroz-feito-na-hora. O feijão já vinha pronto de casa (sempre fiz uma refeição planejando a seguinte). A carne era bife; ou almôndegas preparadas com antecedência, deixadas na gordura de porco; ou frango e as variáveis; ou carne cozida. Sempre tinha uma salada e um legume refogado. Foi o meu tempo de heroína do tempo e refém do sono. Meus minutos rendiam, como se eu dominasse o tempo. Mas eu bem sabia que eu o roubava do sono... Agia como meliante em desproveito próprio!

Depois de aposentada, a panela, debilitada e cheia de falhas, também ficou esquecida num canto, até o dia do descarte. Não mais fazia falta. Já tinha cumprido sua tarefa de ajudante-mor. O tempo passou apressado, praticamente voando no afã de me entregar a velhice que vem tentando tomar conta de mim. Continuo às voltas com panelas. É ao redor delas que vejo resultados palpáveis da minha lida. Hoje, as tais panelas se popularizaram, estão relativamente baratas, quase toda casa tem uma. Os modelos atuais permitem até cozer legumes no vapor do cozimento do arroz! Quando eu ligava minha panela-amiga-ajudante, fechava a porta do apartamento e partia para meu dia de batalha, sentia-me a fada madrinha da Cinderela, fazendo sua magia: zalagadula-mexegadula-pictipoctizum...